quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Capítulo II: O Teste de Ingvar - Parte II

Fui para o grande salão onde me disseram que Wulfgaard estaria. O salão já estava pronto e apenas tratavam de deixar o teto bem feito, para que a água da chuva não entrasse. A fachada era decorada com cabeças de dragões e serpentes, desenhos de lobos, ursos e águias. Quando entrei, avistei Wulfgaard assentado em uma cadeira próxima à lareira, e a sua frente estavam Naddod, Ingvar e padre Baldwyn. As paredes do salão possuíam escudos, lanças, machados e espadas, e também o estandarte do urso.

- Johan! Ainda está vivo homem? – Wulfgaard estendia um pote com hidromel até a boca, e minha alegria ao ver o caldeirão com o líquido foi imediata.

- Não sou tão fácil de matar assim. Bem que tentaram.

- Eu o mando trazer um padre e você me traz um garoto, junto com um guerreiro?

Quando eu abri a boca para falar, Naddod tomou a frente na apresentação.

- Meu nome é Naddod e este é Ingvar, filho de Asgeir, o Manco.

- Asgeir? Aquele porco fedorente ainda vive? – Wulfgaard o conhecia desde criança e ficou surpreso ao saber que ainda vivia. – Conheço seu pai há muito, garoto. Mas então, o que os trouxeram aqui?

- Antes que Ingvar nascesse Asgeir havia dito que seu filho se tornaria um guerreiro pela mão de Wulfgaard, o Urso.

- Já matou algum homem garoto? – Indagou Wulfgaard.

- O garoto já...

- Cale a boca! – Wulfgaard se levantou e arremessou o pote com hidromel para longe. – Eu estou falando com o garoto. A menos que ele seja mudo, sugiro que fique calado. Você é a mãe dele?

- Olha como fala co... – Novamente Naddod fora interrompido quando Wulfgaard foi em sua direção com velocidade, e o empurrou até a parede com seu antebraço, prendendo-o pelo pescoço.

- Olha como fala você, seu vermezinho de merda! – Wulfgaard falava cara a cara com Naddod. – Você não é nada para mim seu bosta. Te mato como mataria sua mãe, mas não quero ter desavenças com Asgeir por tão pouca coisa. Se quiser ficar aqui, dormirá com os cavalos, ou pode ir embora agora.

Wulfgaard o soltou e Naddod caiu de joelhos buscando ar. Ele podia ser um grande guerreiro, mas a fama de Wulfgaard era bem maior. Ingvar olhava assustado o seu novo mestre, enquanto padre Baldwyn soltava um risinho ao ver Naddod tentando se levantar. Eu o olhava sério e com uma enorme vontade de espancá-lo até a morte, mas acho que Wulfgaard não concordaria.

- Nós ainda nos encontraremos Bjorn – Naddod havia se levantado e caminhava para a grande porta do salão. – No campo de batalha ou fora dele. Isso também serve para você, homenzinho.

- Se você tiver amor pela vida, vai querer que isto não aconteça, cãozinho. – Respondeu Wulfgaard rindo e latindo feito um cão.

E assim ele se foi. Naquela mesma noite, Naddod cruzou os portões de Withburga, e só iríamos nos encontrar muito tempo depois. No salão só restavam Ingvar, Padre Baldwyn, Wulfgaard e eu. O padre fazia o sinal da cruz ao ver alguns símbolos e o crânio de um urso acima da cadeira onde Wulfgaard voltava a se sentar.

- Mas que bastardo... Mas eu havia lhe perguntado se já matou algum homem garoto. O que você me diz? – Wulfgaard olhava para Ingvar parecendo que vasculhava sua alma.

- Na verdade sim – Ingvar gaguejava ao falar e tremia um pouco. O olhar inquisidor de Wulfgaard parecia estar dando certo. – Matei meu primeiro homem quando vinha para cá.
- Está com quantos anos garoto?

- Acho que 15, senhor. – Ingvar pareceu envergonhado ao falar sua idade, e assim sabermos que ele nunca havia matado antes daquele dia.

- Seu pai nunca o levou para uma luta, ou mandou você matar alguém?

- Sim senhor, mas eu não manejo a espada com firmeza – O garoto baixou a cabeça mostrando que realmente era um cagalhão. – Não sou, nem acho que serei um bom guerreiro.

- Isso nós ainda vamos ver. Por hora você pode ir. Procure Halfdan e diga que eu mandei arrumar um lugar para você ficar. – Dito isso, Ingvar se retirou do salão. – E quanto a você padre, acho que sabe onde fica a igreja. Lá tem um lugar para você ficar.

- Muito obrigado senhor Wulfgaard. Que Deus lhe abençoe.

- Não preciso do que o seu deus tem – Wulfgaard exibia preso ao pescoço um grosso cordão de prata com martelo de Thor. – É bom que você se comporte padre, ou verá seu deus mais rápido do que imagina.
Padre Baldwyn também se retirou do salão, então Wulfgaard veio querer saber sobre o ataque que sofremos, já que o padre já havia falado por alto o que havia ocorrido. Contei como tudo havia acontecido e Wulfgaard me disse que eu seria chamado de Johan, o Berseker, por causa da minha súbita loucura. Pude enfim beber o hidromel que eu tanto ansiava e comer uma boa carne. Logo depois Halfdan, Eirik e Gudrik chegaram e eu contei novamente a história de como três homens haviam vencido doze, e como um padre atravessou uma lâmina pelo tórax de um homem e assim me salvou. Comemos, bebemos e rimos durante todo o dia, até que à noite fui para casa, onde Ailith ainda me esperava acordada para que travássemos um outro tipo de “batalha”. E tenho que dizer que foi mais cansativa do que a que tive pela tarde.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Capítulo II: O Teste de Ingvar - Parte I

Hoje quando fico sozinho e volto ao passado, me recordo da doce Ailith correndo pela grama verde, brincando nua nas águas do rio Crouch ou aconchegada em meus braços no frio das noites de inverno.

Naquele entardecer primaveril, quando chegamos a Withburga, foi assim. Avistamos o estandarte de Wulfgaard, que era um pano preto em forma de triângulo que ficava com a ponta para baixo. Na parte de cima era escrito Bjorn – que significa urso – e logo abaixo ficava o desenho de um urso em branco. Algumas pessoas trabalhavam na terra fora da paliçada que já estava praticamente pronta, faltando apenas a plataforma onde ficaríamos para acertar com uma lança a cabeça de qualquer desgraçado que chegasse perto demais. Era um muro de terra com uns 4 metros, o que dificultaria a subida de qualquer homem, e logo acima do muro ficava a paliçada com grossas toras de madeira. À frente do muro de terra ficava um fosso com estacas afiadas. O fosso rodeava toda a fortificação, menos no ponto onde ficava o portão, e foi esse portão que eu vi se abrindo e deixando minha Ailith correr em minha direção com os cabelos esvoaçantes, os braços estendidos e aquele sorriso único no mundo.

Ela corria em minha direção chamando meu nome e eu trotei com Swarta até chegar próximo a ela, então apeei e fiquei ao lado do animal esperando que ela chegasse. Ailith se atirou aos meus braços, me jogando para trás fazendo com que eu caísse na grama com ela em cima de mim. Rimos com a queda e eu nunca soube como ela não se machucou ao bater em minha cota de malha.

Vi que algumas pessoas também riam com a cena, e pude ouvir o som do chifre avisando que tínhamos chegado. Naddod e Ingvar passaram por nós e apenas olharam do alto de seus cavalos com arrogância. Padre Baldwyn, ao contrário deles, desmontou de seu cavalo e veio ter conosco.

- Então essa é a bela esposa que você tanto falou? – A pergunta foi feita enquanto ele segurava a mão de Ailith e a abençoava.

- Ela não é minha esposa padre, é minha mulher.

- Johan me disse que você é cristão minha filha. Segue verdadeiramente o caminho de Deus? – Os dois conversavam em saxão, portanto eu não entendia uma palavra. Ailith me contou depois o que falaram naquela hora.

- Sim padre. Faço minhas orações todos os dias.

- Como cristã você deveria se casar com Johan debaixo das bênçãos de Deus. Deseja isso minha filha?

- Claro que sim padre.

- Mas para isso ele deverá se tornar cristão também. Acha que ele aceitará?

- Posso tentar, mas não acho que ele irá negar sua crença nos outros deuses.

Pelo jeito que falavam eu sabia que o assunto era eu. Como não entendia o que diziam, mandei que falassem em dinamarquês.

- Johan. Sua mulher como cristã, deve ser casar com você debaixo das bênçãos de Deus – Padre Baldwyn falava em tom ameno e parecia querer me explicar bem, para que eu aceitasse a proposta. – E para que o casamento seja realizado, você precisa se tornar cristão.

- E como me torno cristão?

- Eu te levarei a um rio, e ali mergulharei o velho Johan para que o novo Johan, lavado e remido pelo sangue de cristo se levante. – Essa explicação de mergulhar no rio, aconteceu porque não existia palavra em nosso idioma que fosse parecida com batismo.

- Você vai me lavar no rio? – Ri ao imaginar o padre gordo e fraco tentando me suspender.

- Não vou te lavar. Lavarei seus pecados e você será purificado para a Glória de Deus.

Ailith apenas nos observava enquanto falávamos. Ela já entendia muitas palavras em dinamarquês, por isso devia estar rezando para que eu também me tornasse cristão.

- Então me lavando no rio eu me torno cristão?

- Sim meu filho.

- E como ficaria com os outros deuses?

- Não há outro Deus além do Deus de Israel Johan!

- Como não padre? Nós invadimos suas terras, matamos seus homens, estupramos suas mulheres e o que o deus cristão fez?

- Tudo faz parte do propósito de Deus, Johan.

- Não padre. Há uma guerra entre os deuses, e parece que a lança de Odin é mais poderosa que a mão do seu deus. – Não sei se Ailith ligava realmente para um casamento cristão, mas eu não trocaria de deuses, ainda mais pelo que estava perdendo.
Padre Baldwyn foi caminhando para entrar na aldeia, e assim que passou pelos portões, beijou o chão. Perguntei a Ailith se tinha o que comer, pois eu estava faminto, e para minha tristeza, apenas míngua de aveia e enguias defumadas. Dei um tapinha em seu traseiro e mandei-a ir na frente que eu ainda iria falar com Wulfgaard.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Capítulo I: Um Novo Começo - Parte IX (final)

- Senhor Jesus! Perdoe-me por ter tirado a vida desse pobre homem – O choro não cessava e as lágrimas escorriam pelo seu rosto cansado. – Quero teu perdão! Não quero ir para o inferno, Deus!


- Por que está chorando padre? Deveria estar alegre, afinal, salvou minha vida. Tenho que admitir que para um padre, você matou bem. Temos uma dívida.


- Você não entende Johan. Eu infringi um dos dez mandamentos de Deus, matei um homem. Como posso ficar alegre sabendo que irei para o tormento eterno do inferno?


- Dez mandamentos? Para quê um homem precisa de tantos? – Padre Baldwyn me olhou com uma cara feia depois que disse isso. – Você iria para o inferno mesmo salvando a vida de outro homem?


- Sim. – Respondeu confuso.


- Se seu deus não entende isso, ele não é Deus. Se ele não é Deus, suas leis não valem, e você não tem com o que se preocupar.


Desde que eu conhecera o padre Baldwyn nunca o tinha visto ou falando algo que mostrasse alguma maldade. Ele realmente não era como os outros malditos padres, bispos e monges que falavam do deus deles, mas acabavam fazendo justamente o contrário. Por isso também é que achávamos divertido matar esses miseráveis e vê-los clamarem para seu deus que nunca os respondia.


Caminhamos de volta para os cavalos, onde Naddod e Ingvar haviam lutado. As mãos do padre ainda tremiam e o soluço de seu choro continuava. O capim alto à nossa volta estava salpicado com o sangue dos saxões que foram mortos, bastardos que agora serviriam de alimento para os animais. Sangue Fresco havia provado o sangue desses saxões imundos e agora estava tão vermelha que não podia se ver o brilho meio azulado do aço de sua lâmina. Meu corpo nu, da cintura para cima, também estava respingado com o sangue dos desgraçados, meus cabelos estavam molhados por causa do suor e sangue, e meu espírito exultante pelo sabor do combate. A morte é minha vida.


- De onde esses bastardos surgiram e por que fugiram assim? – Naddod também sujo de sangue empurrava um dos mortos para o lado com seu pé. – Um bando de covardes!


- Não meu senhor, eles não fugiram porque são covardes, mas sim porque pensaram que Johan era o demônio. – Interveio padre Baldwyn.


- Eu? O demônio? – Dei uma risada e coloquei a camisa e a cota de malha. – Quando eu for o demônio padre, levarei você comigo.


Padre Baldwyn fez o sinal da cruz.


- Johan, um homem que tira a cota de malha, elmo, e luta sem escudo como peito nu, não é algo muito comum de se ver.


- Também não é comum um padre matar um homem, do seu próprio povo, e, no entanto você o fez. – Naddod falou rispidamente enquanto bebia um gole d’água.


- Matei por impulso e estou arrependido. Estou em pecado e não sou merecedor da glória de Deus. – O padre estava com as mãos para o alto e olhava para o céu.


- Pare com essa baboseira padre – Não adiantava que o santo homem ficasse choramingando o que já fora feito. – Eu ficando sem o equipamento, só serviria de incentivo para que eles atacassem, e não fugissem como veados sendo caçados.


- Seus olhos Johan, estão vermelhos. Ficaram irritados por causa da fumaça, e você ainda partindo apenas com sua espada, eles pensaram que você fosse o demônio. – O padre ria com o que dizia.
- Eu já sabia que eram todos uns cagalhões covardes, mas achar que o homenzinho fosse o demônio é burrice – Naddod ria com o ocorrido ou por terem achado que eu seria um demônio. - Fugiram de medo por causa de um skald. Medrosos.


Eu já estava novamente vestido para a guerra e prendia meu escudo à sela de Swarta. Ingvar estava sentado em seu elmo e olhava para o chão com uma expressão de completo idiota, enquanto limpava sua espada em um movimento quase automático e frenético. Ele podia ser um cagalhão, mas eu não o culpava, afinal, sentir o gosto do sangue de um homem pela primeira vez era algo único e medonho. Eu me lembro da primeira vez que matei um homem, eu tinha 12 anos e não foi nada fácil. Quando eu escrevo um poema sobre os homens e suas vitórias, sempre descrevo como foi fácil para o guerreiro matar o inimigo, me pagam bem para isso, mas só quem luta é que sabe que matar é uma arte difícil de aprender, mas depois de dominada transforma um homem em uma arma letal.


- Acha que eram tão medrosos assim cão imundo? - Só porque tivemos um contratempo, não significava que eu fugiria de Naddod, por isso o convidei para o combate. – Se pensa assim, lute comigo e descubra o motivo de tamanho medo.


- Não tenho medo de um homenzinho. O matarei logo e mijarei em você, depois seguirei viagem. Quando chegar ao mundo dos mortos, Hel saberá que morreu por minhas mãos ao sentir o cheiro do meu mijo.


Como antes, nós dois empunhávamos as espadas e trocávamos insultos, e em breve, sangue seria derramado.


- Se ficarmos aqui, os homens que fugiram irão voltar com reforços, e não haverá demônio que os espante. – Ingvar falou pela primeira vez desde o ataque.


- O senhor Ingvar está certo, e além do mais, se perdermos tempo com mais uma luta, não chegaremos antes do anoitecer em Withburga.


Naddod e eu nos encaramos ainda por alguns minutos, e sem dizer uma palavra, percebemos que Ingvar e padre Baldwyn estavam certos. Era muito arriscado ficarmos ali e aparecerem mais saxões, por isso embainhamos as espadas e montamos novamente. Antes nós ainda pegamos duas espadas, dois elmos, uma cota de malha e três machados.


Ao chegar a Withburga, contaria o ocorrido a Wulfgaard e eu sabia que descobriríamos quem foram os saxões que nos atacaram. Não pertenciam a nenhum exército, portanto eram camponeses que não estavam satisfeitos com o controle dinamarquês na sua terra, ou algum monge incitou-os ao levante. Os desgraçados iriam pagar por isso, assim como suas mulheres, filhos e filhas. Mas, para que isso ocorresse, deveríamos chegar à aldeia antes do anoitecer. Agradeci a Odin pela vitória e trotamos pela estrada.


Nesse momento eu apenas desejava beber um bom hidromel, comer uma boa carne e ter a minha mulher.

Eu apenas desejava isso.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Capítulo I: Um Novo Começo - Parte VIII

O grito que Ingvar deu quando viu os saxões, se igualava ao grito de uma menina vendo um enxame de abelhas. Os desgraçados haviam colocado aquela carroça ali justamente para que um pequeno grupo parasse e eles atacassem. Começaram a aparecer do mato alto e foram nos cercando rapidamente. Pude contar doze homens, mas poderia haver mais escondidos. Não eram homens pertencentes a um exército, a maioria não tinha cota de malha ou couro, utilizavam apenas lã. Dois ou três estavam com couro apenas. Também não havia muitas espadas nem escudos, nos atacariam com lanças, foices e machados em sua maioria. Mesmo assim ainda estávamos em desvantagem, éramos dois contra doze, já que Ingvar era inexperiente e o padre Baldwyn ainda não tinha aparecido desde que caíra no mato alto.

- De costas um para o outro! – Eu gritava a ordem para que os dois imbecis viessem para junto de mim e formássemos um triângulo, onde um ficando de costas para o outro, nos defenderíamos melhor.

Eu não acreditava que sairíamos com vida dali. Eu sabia que o triângulo não iria durar muito tempo, e quando isso acontecesse, os dois que estariam de pé receberiam a lâmina no meio das costas e assim minha missão estaria terminada.

Ingvar estava na minha direita e sua espada tremia feito vara verde. Coitado do cagalhão. Imagino que seu pai já o tenha levado para assistir alguma batalha, mas já tendo visto ou não, lutar contra doze saxões ao lado de apenas dois guerreiros dinamarqueses, dava medo em qualquer um. Até Naddod que parecia ser um bom guerreiro, não parava de xingar e reclamar por não termos avançado com os cavalos pelo capim alto, e assim, fugido dos saxões. Eles, por sua vez, estavam agora vindo devagar e se juntavam mais. Seria apenas um ataque, homem após homem, eles viriam para nos matar.

- Teremos que segurar esses desgraçados ao máximo – Eu estava nervoso, mas conseguia pensar no que fazer, isso é ser um guerreiro. – Vamos acabar com o moral deles e depois com suas vidas!

- Depois que isso terminar, resolveremos nosso problema, pequeno guerreiro. – Naddod mantinha os olhos fixos nos saxões á sua frente, insultava-os e batia com sua espada na bossa do escudo vermelho e branco que carregava.

Os saxões iam chegando mais perto e o cerco ia se fechando. Os cães que Naddod trouxera estavam latindo sem cessar para o inimigo, e só aguardavam a ordem para atacar e assim, poderem rasgar pele e músculos com seus afiados dentes. Meus pés estavam firmes no chão, minha mente concentrada em apenas retalhar e matar, e eu segurava com força Sangue Fresco. A fumaça era soprada pelo vento em nossa direção fazendo com que meus olhos ardessem e minha boca ficasse seca. O suor descia de minha testa e eu sentia a cota de malha pesar sobre meu corpo. O elmo parecia me atrapalhar e o escudo não me permitia fazer movimentos rápidos. Não sabia o que estava havendo comigo, pois sempre lutei muito bem com todo esse equipamento, mas naquele dia era diferente. Eu me sentia pesado e lento com tudo aquilo e ainda tinha a maldita fumaça que fazia com que meus olhos ardessem sem parar.

Os saxões estavam mais perto, ao ponto de podermos ver os dentes podres que eles exibiam com as risadas que davam, em ver três ratos dinamarqueses totalmente cercados. O que eles não tinham aprendido ainda, ou tinham se esquecido, é que nós dinamarqueses não somos ratos como eles. Nós somos ursos que urram diante da morte.

- Seus vermes filhos de uma cadela imunda!

Eu não conseguia mais ficar sentindo todo aquele peso sobre meu corpo, e em um ato rápido e impensável, joguei o elmo no chão, tirei a cota de malha e minha camisa, e deixei o escudo cair de meu braço. Eu estava nu da cintura para cima e meu corpo mostrava as marcas de antigos combates. Meu cabelo estava preso por uma fita de couro, então o soltei e naquele momento o festim de sangue, a vontade de matar, o gosto pela morte havia tomado conta de mim.

Nesse momento do gosto pela matança eu não consigo me lembrar de tudo, mas sei que abandonei o triângulo e corri em direção ao saxão que estava à minha frente exibindo aqueles dentes podres. Ouvi o comando de Naddod para seus cães, que passaram correndo por mim e saltaram sobre um dos homens. Mas o que eu queria era o saxão à minha frente, que vinha empunhando uma foice. Corri em sua direção com Sangue Fresco abaixada, deslizando sobre o capim da minha lateral. O homem baixou a foice, cortando o ar, vindo na altura dos meus olhos, então levantei Sangue Fresco e aparei seu golpe jogando a foice para longe. Ele estava com uma expressão de pavor e abriu os braços como se pedisse misericórdia, o problema é que eu não sou Deus para tê-la. Com Sangue Fresco ainda no ar, baixei-a e fiz um corte fundo no peito do homem que caiu de braços abertos e esvaindo-se em sangue. Havia sangue dele salpicado no meu rosto e no meu corpo, e como tudo estava sendo muito rápido um segundo agressor tentou investir sua espada contra meu flanco esquerdo. Girei e aparei o golpe, bati com o punho de Sangue Fresco na sua cara de porco e vi alguns dentes voarem junto com sangue. O homem cambaleou e antes mesmo que abrisse os olhos, cravei minha lâmina em seu peito, fazendo com que ele se encolhesse para frente. Ele estava caindo, então puxei Sangue Fresco, sangue voou sobre o capim, e antes que ele caísse a enterrei em suas costas. Sangue Fresco ficou presa e tive que pisar no homem ainda agonizante para soltá-la. Vi que os outros saxões estavam fugindo apavorados, e que Naddod e Ingvar também tinham lutado.
Eu estava com a respiração pesada e com uma vontade enorme de continuar a matança. Ainda com o pé no peito do saxão com cara de porco, levantei minha espada e dei um brado de vitória a Odin, e não teve como não ouvir. Fui caminhando em direção aos dois, quando escutei um gemido atrá de mim. Virei-me e vi que um saxão estava parado com uma lâmina saindo de seu peito, o machado em sua mão havia caído e seu corpo perdia a força. Seus olhos já sem o brilho de vida olharam nos meus enquanto ele caía. Foi então que vi padre Baldwyn atrás do homem caído, suas mãos sujas de sangue e uma cara de assustado pior que a de Ingvar. Ele caiu de joelhos e começou a chorar feito uma criança desmamada. Olhava para as mãos sujas com o sangue do homem que matou e pedia perdão pelo que tinha feito.