quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Capítulo II: O Teste de Ingvar - Parte I

Hoje quando fico sozinho e volto ao passado, me recordo da doce Ailith correndo pela grama verde, brincando nua nas águas do rio Crouch ou aconchegada em meus braços no frio das noites de inverno.

Naquele entardecer primaveril, quando chegamos a Withburga, foi assim. Avistamos o estandarte de Wulfgaard, que era um pano preto em forma de triângulo que ficava com a ponta para baixo. Na parte de cima era escrito Bjorn – que significa urso – e logo abaixo ficava o desenho de um urso em branco. Algumas pessoas trabalhavam na terra fora da paliçada que já estava praticamente pronta, faltando apenas a plataforma onde ficaríamos para acertar com uma lança a cabeça de qualquer desgraçado que chegasse perto demais. Era um muro de terra com uns 4 metros, o que dificultaria a subida de qualquer homem, e logo acima do muro ficava a paliçada com grossas toras de madeira. À frente do muro de terra ficava um fosso com estacas afiadas. O fosso rodeava toda a fortificação, menos no ponto onde ficava o portão, e foi esse portão que eu vi se abrindo e deixando minha Ailith correr em minha direção com os cabelos esvoaçantes, os braços estendidos e aquele sorriso único no mundo.

Ela corria em minha direção chamando meu nome e eu trotei com Swarta até chegar próximo a ela, então apeei e fiquei ao lado do animal esperando que ela chegasse. Ailith se atirou aos meus braços, me jogando para trás fazendo com que eu caísse na grama com ela em cima de mim. Rimos com a queda e eu nunca soube como ela não se machucou ao bater em minha cota de malha.

Vi que algumas pessoas também riam com a cena, e pude ouvir o som do chifre avisando que tínhamos chegado. Naddod e Ingvar passaram por nós e apenas olharam do alto de seus cavalos com arrogância. Padre Baldwyn, ao contrário deles, desmontou de seu cavalo e veio ter conosco.

- Então essa é a bela esposa que você tanto falou? – A pergunta foi feita enquanto ele segurava a mão de Ailith e a abençoava.

- Ela não é minha esposa padre, é minha mulher.

- Johan me disse que você é cristão minha filha. Segue verdadeiramente o caminho de Deus? – Os dois conversavam em saxão, portanto eu não entendia uma palavra. Ailith me contou depois o que falaram naquela hora.

- Sim padre. Faço minhas orações todos os dias.

- Como cristã você deveria se casar com Johan debaixo das bênçãos de Deus. Deseja isso minha filha?

- Claro que sim padre.

- Mas para isso ele deverá se tornar cristão também. Acha que ele aceitará?

- Posso tentar, mas não acho que ele irá negar sua crença nos outros deuses.

Pelo jeito que falavam eu sabia que o assunto era eu. Como não entendia o que diziam, mandei que falassem em dinamarquês.

- Johan. Sua mulher como cristã, deve ser casar com você debaixo das bênçãos de Deus – Padre Baldwyn falava em tom ameno e parecia querer me explicar bem, para que eu aceitasse a proposta. – E para que o casamento seja realizado, você precisa se tornar cristão.

- E como me torno cristão?

- Eu te levarei a um rio, e ali mergulharei o velho Johan para que o novo Johan, lavado e remido pelo sangue de cristo se levante. – Essa explicação de mergulhar no rio, aconteceu porque não existia palavra em nosso idioma que fosse parecida com batismo.

- Você vai me lavar no rio? – Ri ao imaginar o padre gordo e fraco tentando me suspender.

- Não vou te lavar. Lavarei seus pecados e você será purificado para a Glória de Deus.

Ailith apenas nos observava enquanto falávamos. Ela já entendia muitas palavras em dinamarquês, por isso devia estar rezando para que eu também me tornasse cristão.

- Então me lavando no rio eu me torno cristão?

- Sim meu filho.

- E como ficaria com os outros deuses?

- Não há outro Deus além do Deus de Israel Johan!

- Como não padre? Nós invadimos suas terras, matamos seus homens, estupramos suas mulheres e o que o deus cristão fez?

- Tudo faz parte do propósito de Deus, Johan.

- Não padre. Há uma guerra entre os deuses, e parece que a lança de Odin é mais poderosa que a mão do seu deus. – Não sei se Ailith ligava realmente para um casamento cristão, mas eu não trocaria de deuses, ainda mais pelo que estava perdendo.
Padre Baldwyn foi caminhando para entrar na aldeia, e assim que passou pelos portões, beijou o chão. Perguntei a Ailith se tinha o que comer, pois eu estava faminto, e para minha tristeza, apenas míngua de aveia e enguias defumadas. Dei um tapinha em seu traseiro e mandei-a ir na frente que eu ainda iria falar com Wulfgaard.

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