quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Cap. I: Um novo começo - Pt. I

Haviam se passado algumas semanas desde aquela noite. Ailith já arriscava algumas palavras em Dinamarquês e nós conhecíamos um ao outro a cada dia que passava. Assim como a maioria dos saxões, ela rezava para o deus cristão, mas isso nunca causou uma briga entre nós.

A aldeia estava mudando, crescendo. Casas estavam sendo construídas, a velha igreja de pedra estava sendo reformada, um grande salão quase pronto tomava lugar no ponto mais alto da aldeia, que ficava junto ao paredão de pedra que terminava no rio. A paliçada também estava sendo feita com agilidade, pois seria a nossa única defesa contra um ataque saxão.

Agora, Ailith e eu, tínhamos a nossa própria casa, que dividíamos com mais duas famílias. Não era o melhor conforte que eu queria dar a ela, mas foi o que eu consegui de melhor. A casa possuía apenas um cômodo. Tinha o chão de junco, uma lareira no centro dele, que servia para fazer a comida e iluminá-lo. Havia uma abertura no teto de turfa para a fumaça sair, mesmo assim a maior parte da fumaça ficava dentro da casa e os incêndios eram constantes. O cômodo possuía também um pequeno tablado de madeira nas laterais e no fundo, onde ficava a cama-caixote para Ailith e eu, e também uma cadeira entalhada onde somente o chefe da casa poderia se sentar. E o chefe da casa era eu, porque agora eu tinha uma família.

Haviam chegado pelo rio pelo rio Crouch, há uns dias atrás, dois knorrs – que era a embarcação utilizada para transporte. – com as esposas, irmãs, irmãos e filhos dos homens que agora moravam na aldeia. Nem todo homem possuía esposa e filhos na Dinamarca, e esses, assim como eu, logo formaram família com as mulheres saxãs encontradas lá mesmo, ou em vilarejos próximos onde fazíamos saque. Esses homens, por amor ou influência das esposas, acabavam se tornando cristãos. E assim a população cristã foi crescendo junto a nós, os pagãos.

À pedido dos cristãos a igreja estava sendo reformada para que os novos e antigos tivessem aonde falar com o seu deus, e também foi pedido que um padre fosse mandado à aldeia para realizar as missas.


Wulfgaard não questionou o pedido dos cristãos, afinal, queria agradar saxões e dinamarqueses. Quando tomávamos uma cidade, matávamos apenas os homens que a defendiam. Os outros continuavam lá, com a mesma vida de antes. Até mesmo os governantes eram mantidos, mas quem dava as ordens, éramos nós. Por conta disso, Wulfgaard me incumbiu de apanhar um padre que se encontrava na cidade de Thundersley, que ficava a meio dia de cavalgada. Meu senhor não queria que eu fosse sozinho e falou para que eu levasse alguns homens comigo, mas preferi ir sozinho, assim iria mais rápido. Me despedi de Ailith nas primeiras horas da manhã daquele dia e disse que voltaria logo. Ela estava apreensiva, não queria que eu fosse sozinho. Ainda havia saxões escondidos em alguns lugares. Pequenos grupos, mas contra apenas um homem poderia significar a morte. Mesmo assim eu tentei tranquilizá-la dizendo que amanhã eu estaria chegando com o tal padre. Ela me abraçou e me deu um beijo demorado. Tentou esconder, mas eu vi que tinha lágrimas em seus olhos quando me afastei da casa indo em direção ao estábulo apanhar Swarta, meu cavalo negro como a escuridão.

- Uuuh... Agora além de cantarolar, também toma conta de velhos.

- Não sei o que sua mãe tinha na cabeça quando pariu a mesma coisa que eu cago, Halfdan.

- Hahaha! Se minha mãe parisse o que você caga, ela o chamaria de Johan!

Os homens riram alto dos insultos amigáveis trocados entre nós. Havia bastante movimento no centro da aldeia. Mulheres carregavam cestos, homens trabalhavam nas casas, na igreja e na paliçada, e crianças corriam ou simulavam combates empunhando pedaços de pau.

- Fiquei sabendo que você vai buscar o padre em outra cidade, e pelo jeito quer se divertir sozinho. – Halfdan estava no centro da aldeia com outros homens.

– É verdade. – respondi. – Quis ir sozinho porque não há motivo para cansar mais cavalos, e também eu não iria cavalgar meio dia de viagem ouvindo sua voz, como se uma cabra velha estivesse balindo ao meu lado.

- Você está muito engraçadinho hoje – Halfdan ria com os outros homens. – tome cuidado para que nenhum saxão enfie uma lança pelo seu rabo e saia pela sua boca.

Eu apenas aquiesci e me dirigi ao estábulo. Selei Swarta, acariciei seu focinho, dei um tapinha em sua barriga e montei. Swarta era um garanhão grande e veio em um dos knorrs que chegaram com as famílias. O céu estava limpo e já não fazia tanto frio, pois a primavera havia chegado. Cavalguei em direção ao que seria o portão da aldeia. Ainda estava sendo construído. E lá estava Ailith com as mãos entrelaçadas, olhos vermelhos, segurando um cordão de couro com uma cruz amarrada na ponta.

- Johan! – Ela gritou. – Que Deus esteja com você.
Ela ergueu o cordão e eu me abaixei. Ela o pôs em meu pescoço e a cruz ficou sobre a roupa. Bati o calcanhar em Swarta, saí da aldeia, e assim comecei minha jornada para buscar um padre.

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