quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Capítulo II: O Teste de Ingvar - Parte V

Após ter feito o que viera fazer, Wulfgaard voltou com os outros para a aldeia, já que não ficava tão longe. Eu fiquei pensando que em dois dias sujaria Sangue Fresco com o sangue de um Bispo. Em um reino onde era mais importante rezar do que lutar, matar um Bispo era algo que me deixava feliz.

As revoltas contra nosso domínio são comuns. Alguns homens dizem que não irão pagar os impostos, mas depois que alguns deles são mortos a revolta acaba. Todos os reinos saxões que tomamos nós deixamos o rei em seu trono, ou, os ealdormen, que são os principais nobres da terra. Os reis e os ealdormens são o poder de um reino, são homens que têm grandes terras e montam exércitos. Abaixo deles estão os reeves, que são responsáveis pela lei na terra de um senhor. Os homens ricos que podem liderar seguidores na guerra, mas que não possuem grandes terras como os nobres, são chamados de thegns. Abaixo deles estão os ceorls, que são todos os homens livres, mas se perder seu meio de vida, pode se tornar um escravo. É assim que os saxões se organizam, mas no fim, quem dita as regras somos nós, eles são apenas meros fantoches guiados por nossas mãos. Eles e os malditos homens da Igreja eram quem instigavam as revoltas, ou ao menos sabiam delas, mas quando chegávamos para saber o que tinha acontecido, eles nunca sabiam de nada, ou, dizem que não tinha sido nada que tenha fugido do controle.

Naquela noite, um pouco antes de dormir, Ailith e eu conversamos sobre o que seria feito, entre outras coisas, e uma delas era que nome teria o filho que estava por vir. Eu disse que se fosse menino Iria se chamar Egil e se fosse menina Sigrid. Porém, ela queria que tivesse um nome saxão, e menina seria Ealdgyth, enquanto menino seria Aiken.

Falei que isso não era nome de homem e que para mim, os dois eram de menina. Ela se zangou e falou que era para eu dormir lá fora, mas então eu perguntei o que Aiken queria dizer e ela me respondeu que significava feito de carvalho. Ela disse que nosso filho seria forte como um carvalho, então eu aprovei e fomos dormir. Eu estava feliz pois tinha uma boa mulher, teria um filho forte como um carvalho e em dois dias mataria alguns monges e um Bispo.


Não se passaram nem muitos anos desde o nosso ataque à Selsey, e a estória já mudou e cresceu absurdamente. Sendo um skald, eu sei que quando uma estória é contada, sempre se aumenta um pouco os fatos. A briga sempre se torna uma grande batalha, poucos homens tornam-se milhares, e que aquele que foge ou se esconde, acaba se tornando o grande herói e será lembrado para sempre. Nós somos pagos para aumentarmos os fatos, e não relatar o que realmente aconteceu.

Hoje, quando falam dos perversos vikings que atacaram o pobre mosteiro de Selsey, dizem que um verdadeiro exército cercou o local, quando na verdade éramos apenas 76 homens. A tripulação do Cavalo do Mar era de 72 homens que se revezavam em, 36 por vez, nos 18 remos que faziam o Cavalo do Mar deslizar pelas águas.

Naquela manhã eu havia ido para a aldeia, que crescia a cada dia, e levei Ingvar comigo. Wulfgaard havia mandado duas serviçais para que Ailith não ficasse sozinha, e com elas, também foram dois homens para as protegerem de qualquer animal ou ladrões.

O Cavalo do Mar já estava pronto para cortar o mar, assim como minha espada corta os homens. Acho que nenhum dinamarquês consegue ficar longe do mar por muito tempo, e eu já não via a hora de sentir o balanço das águas, o vento forte batendo em meu rosto, e as pequenas gotas que sobem e refrescam em um dia de sol forte.

O dia não estava muito bom para navegar, mas quando chegássemos ao mar, faríamos um sacrifício a Njord. Colocamos Ingvar em um dos remos para que aprendesse os mistérios do mar, e também treinasse sua musculatura. O garoto era magro, mas já estava ganhando músculos com facilidade, devido ao nosso treinamento diário. Reclamava de dor, mas quando ele entrasse em sua primeira parede de escudos, os músculos que doeram para se formar, seriam melhores do que um braço fraco e corpo mole. E assim ele remou pelo Crouch, as pás dos remos batiam na água e refletiam a pouca luz de sol que havia. As nuvens pareciam nos seguir, mas não desistimos da idéia. O outono estava chegando e com ele, suas tempestades.

Então chegamos ao mar.

As ondas estavam batendo forte contra a costa e o vento soprava com furor. Ingvar deveria agradecer naquele dia, pois, por causa do vento, puxamos os remos para dentro e tapamos os buracos. Antes que partíssemos definitivamente, matamos um porco e deixamos o sangue correr pelo barco. Jogamos o animal ao mar para que Njord aceitasse o sacrifício e nos desse uma boa viagem. O vento agora batia com força na grande vela do Cavalo do Mar e fazia com que ele cortasse as ondas que cresciam à sua frente. Não é fácil guiar um navio desses pela vastidão do mar, ainda mais em um dia daquele, mas quem guiava era o “Urso”, Bjorn, o homem que mais amava aquele navio, e conhecia o mar tanto quanto um padre conhece a prata.

Selsey ficava no litoral de Wessex, o único reino que ainda não tinha caído diante dos nossos olhos, mas sua hora chegaria. Wessex tinha por rei Æthelred, um bom rei pelo que diziam. Tinha um filho chamado Æthelwold que era ainda um bebê. Quem estava sempre ao seu lado era Alfredo, seu irmão. Mas essa já é outra história.

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